Percentual de famílias com renda de até 10 salários mínimos que atrasaram contas em novembro atinge pico de série da CNC. Juros altos elevam as despesas financeiras
Se o superendividamento e a inadimplência afetam as famílias brasileiras de todas as classes sociais, entre as de menor renda a deterioração das condições financeiras avança mais rapidamente. A “herança maldita” de Jair Bolsonaro e Paulo Guedes – precarização do mercado de trabalho, baixos rendimentos e juros elevados – eleva a inadimplência entre os mais pobres a patamares históricos.
Enquanto 30,3% das famílias brasileiras tinham alguma dívida atrasada em novembro, entre os consumidores com até 10 salários mínimos de renda mensal o percentual dos que atrasaram pagamentos é de 34,1%. Essa é a maior proporção da série histórica da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic), da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), iniciada em 2010.
O percentual de famílias que relataram ter dívidas (cheque pré-datado, cartão de crédito, cheque especial, carnê de loja, crédito consignado, empréstimo pessoal, prestação de carro e de casa) a vencer (78,9%) recuou 0,3 pp em novembro. Mas avançou dez vezes (3,3 pp) na comparação com novembro de 2021.
“Os orçamentos das famílias de menor renda seguem apertados porque os juros altos aumentam as despesas financeiras associadas às dívidas em andamento. Com maior nível de endividamento, está mais difícil pagar todos os compromissos em dia, contas de consumo e dívidas”, explica Izis Ferreira, economista responsável pela pesquisa.
A economista da CNC destaca o aumento do volume de consumidores com mais da metade da renda comprometida com o pagamento de dívidas. Em novembro, ele alcançou 21,6% do total de endividados. Um crescimento anual de 0,8 ponto percentual.
“Em média, o brasileiro precisou gastar 30,4% de toda a sua renda apenas para pagar dívidas em novembro, isso sem contar os serviços e as contas de consumo como água, energia, telefone, gás, entre outras”, avalia Izis. “Ou seja, a cada R$ 1.000 do rendimento, em média R$ 304 estão comprometidos com dívidas.”
Superendividamento e inadimplência elevam spreads bancários
O levantamento da CNC revela que a inadimplência avançou 4,2 pontos percentuais (pp) em um ano. Com isso, o volume de consumidores que revelaram não ter condições de pagar dívidas já atrasadas de meses anteriores em novembro chegou a 10,9% do total de famílias. Entre as com menores rendimentos, o indicador também é mais alto, atingindo 13,4% das famílias que permanecerão inadimplentes.
Também piorou o número de pessoas que reportaram atrasos na quitação de dívidas por mais de 90 dias. Das famílias inadimplentes, 42,5% estão com atrasos acima de três meses. Um aumento mensal de 0,6 pp, e de 1 pp no comparativo anual.
“Não à toa, o spread bancário, que é a diferença entre os juros que os bancos cobram nos empréstimos e os que recebem ao captar recursos de investimentos, chegou ao maior nível desde julho de 2019: 44,4 pontos percentuais, conforme dados de outubro do Banco Central”, aponta Izis Ferreira.
A economista da CNC explica que o valor do spread é utilizado pelas instituições financeiras para cobrir, entre outros gastos, as despesas com inadimplência. Elas vêm sendo revistas para cima pelas empresas que operam crédito no país.
No contexto de encarecimento do crédito, a proporção de famílias que se consideram muito endividadas chegou a 17,5% do total de lares em novembro. Uma alta mensal de 0,2 pp e de 2,7 pp na comparação anual.
A piora nesse indicador foi mais expressiva entre as mulheres (com alta de 3,3 pp) do que entre os homens (aumento de 1,9 pp), em 12 meses. O público feminino é o mais endividado atualmente: 80,7% possuíam algum tipo de dívida em novembro.
A percepção de superendividamento também aumentou, especialmente entre os consumidores com mais de 35 anos: 19,5% deles afirmaram estar muito endividados, um aumento anual de 3,2 pp. No corte escolaridade, pessoas sem ensino médio completo são o grupo em que o superendividamento mais cresceu em um ano (3,9 pp).
“Mesmo com o cenário de melhoria do mercado de trabalho, os consumidores seguem cautelosos quanto à contratação de novas dívidas neste fim de ano. Tanto pelo alto índice de endividamento e comprometimento da renda quanto pelos juros, que seguem altos”, finaliza o presidente da CNC, José Roberto Tadros.
Da Redação, com informações da CNC