Pária global, chefe do Executivo recebe críticas por transformar púlpito das Nações Unidas em palanque. “Uma pessoa séria não faz provocações”, lamenta Lula
De vexame em vexame, Jair Bolsonaro encerra sua campanha eleitoral custeada com recursos públicos no exterior. Após a bisonha passagem pelo funeral da rainha Elizabeth 2ª em Londres, ele encerrou o périplo com o tradicional discurso do mandatário brasileiro na abertura da 77ª Assembleia-Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), nesta terça-feira (20), fazendo o mesmo que nos anos anteriores: torturando os fatos, atacando os “inimigos” com mentiras e justificando sua fama de pária global.
Peixe fora d’água em uma plenária onde o lema dos debates é ‘Soluções por meio da solidariedade, sustentabilidade e ciência’, Bolsonaro passou pelo vexame de ver o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, abrir mão da tradição de discursar logo em seguida ao brasileiro. A decisão de Biden, que só falará na quarta (21), ajudou a esvaziar uma audiência desinteressada do já previsível e irrelevante roteiro de Bolsonaro.
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O inquilino do Palácio do Planalto também teve que ver o prédio da ONU em Nova York amanhecer coberto por palavras como “vergonha”, “desgraça” e “mentira” escritas em português e quatro de suas línguas oficiais– inglês, francês, espanhol e mandarim. Em 2021, a US Network for Democracy in Brazil (Rede nos Estados Unidos pela Democracia no Brasil), que promoveu a intervenção, referiu-se a Jair como “criminoso climático”.
“Somos opositores ferrenhos desse governo brasileiro por todas as atrocidades que ele representa”, disse Mariana Adams, organizadora nacional do US Network for Democracy in Brazil. “Nossa ação comunica ao mundo que Bolsonaro está apoiado em um sistema de fake news para avançar seu projeto pessoal de poder e de enriquecimento, não um projeto nacional de desenvolvimento do Brasil.”
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Segundo ela, as aparições internacionais de Bolsonaro “desmantelaram, de maneira sistemática, a imagem do Brasil no exterior, seja pela desastrosa política externa brasileira, seja pelas aparições internacionais que visam benefícios políticos eleitorais”.
Bolsonaro ainda teve que ouvir o secretário-geral da ONU, Antônio Guterres, fazer um duro discurso contra líderes negacionistas da crise climática e alertar que “o planeta está queimando” – referência aos “dias de fogo” bolsonaristas? Guterres disse que “ódio e a desinformação estão proliferando, principalmente contra mulheres e grupos vulneráveis”, em um mundo que vive uma “disfunção colossal”.
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Depois da eloquente fala de Guetters, o chefe do Executivo brasileiro mentiu, dizendo que seu governo “não poupou esforços para salvar vidas e preservar empregos” durante a pandemia, negar o avanço brutal da fome no Brasil e se vangloriar de o agronegócio nacional “alimentar um bilhão de pessoas ao redor do mundo”. Bolsonaro também garantiu que eliminou a “corrupção sistêmica no governo” e que “dois terços de todo o território brasileiro permanecem com vegetação nativa, exatamente como quando o Brasil foi descoberto, em 1500”.
Jamil Chade: “Retrato de um país apequenado no mundo”
Ao final do comício – encerrado com a palavra de ordem “Deus, pátria, família e liberdade”, usada por líderes fascistas no passado – o jornalista Jami Chade afirmou em sua coluna no portal UOL que a intervenção, “epígrafe de uma diplomacia que um dia foi respeitada”, chocou os governos estrangeiros por ter transformado a tribuna das Nações Unidas em palanque eleitoral.
“Foi o retrato de um país ‘apequenado’ no mundo, que não atua como protagonista e que perdeu seu lugar”, apontou Chade. “Teu presidente não entendeu onde está, quem ele representa e o cargo que ocupa”, relatou o jornalista sobre a mensagem recebida de um experiente embaixador enquanto Bolsonaro ainda falava.
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Também chamou a atenção dos diplomatas, continua Chade, “a omissão a qualquer referência aos quase 700 mil mortos na pandemia, às queimadas e desmatamento recorde, à destruição dos mecanismos de direitos humanos e seus ataques contra a democracia”. As investidas contra a imprensa nacional e estrangeira, em vez de propostas concretas sobre o combate ao desmatamento, também foram alvo de críticas.
Nas redes sociais, Luiz Inácio Lula da Silva fez um breve comentário sobre o desastrado relacionamento de Bolsonaro com líderes mundiais importantes. “Uma pessoa séria não faz provocações, mesmo que você não goste. E nosso presidente afronta o presidente da França, de Portugal, afronta a Europa, e se subordinou ao Trump. E agora ninguém quer vir ao Brasil, um país alegre como o nosso”, lamentou Lula em postagem no Twitter.
Antes da fala de Bolsonaro, Chade revelou que governos democráticos articulam nos bastidores um reconhecimento praticamente imediato dos resultados das eleições no Brasil, a exemplo do ocorrido nos Estados Unidos contra Donald Trump. “Com detalhes mantidos em sigilo absoluto para não representar uma interferência na política doméstica brasileira, o gesto tem como objetivo blindar a democracia brasileira e evitar que o país entre em um limbo constitucional ou em uma ruptura democrática”, afirmou.
Fonte: PT