A era destrutiva bolsonarista deixou um rastro de 1.171 casos de violência contra defensores e defensoras de direitos humanos em apenas quatro anos. Crimes como assassinatos, atentado, calúnias, ataques racistas e até suicídios fazem parte do cenário de violação de direitos que marcou o mandato de Jair Bolsonaro entre 2019 e 2022. Os dados, inéditos, foram divulgados nesta quarta-feira, 14, e compilados pelas organizações não governamentais (ONGs) Terra de Direitos e Justiça Global.
O relatório confirma, no recorte por raça, que a negligência do governo Bolsonaro resultou em um número alarmante de violações. De 598 pessoas vítimas de violência, 346 foram indígenas e 153 negros. Juntos, eles representam 83,4% das vítimas com informação sobre a classificação racial disponível. Sem contar os assassinatos.
O deputado federal, Nilto Tatto (PT-SP), enfatiza como o governo bolsonarista incentivou o genocídio dos indígenas e o abandono, por exemplo, dos povos Yanomami.
“O relatório divulgado hoje causa espanto e comprova como o governo anterior não só fez vista grossa como deu apoio institucional e político a projetos anti-indígenas e que visassem criminalizar a luta em defesa dos Direitos Humanos. O incentivo à mineração, inclusive a ilegal, e a articulação política em torno de leis que afrouxaram a mudança de proteção ambiental, aliaram a decretos e iniciativas que facilitam a “passagem da boiada”, como disse o ex-ministro Ricardo Salles, são ações com as digitais do ex-presidente Bolsonaro que aspiram para esse rastro de mortes”.
Todas as regiões do Brasil
A quarta edição do levantamento ‘Na Linha de Frente: violação contra quem defende direitos humanos’ mapeou ocorrências em todas as regiões do Brasil.
O estado com maior número de registros foi o Pará, onde foram registrados 143 casos de violência. Os estados do Maranhão (131), Bahia (109) e Pernambuco (100) também tiveram um número elevado de ataques contra dos defensores e defensoras de direitos humanos.
A pesquisa também constatou situações de violência nas regiões Norte e Nordeste, que responderam por 63,9% do total de casos.
Dos 1.171 casos mapeados, apenas 41,6% tiveram como alvo uma só pessoa. No restante, houve duas ou mais vítimas. O estudo conseguiu identificar o nome de 65 indivíduos que apareceram em pelo menos dois episódios, ocorridos em dados diferentes, o que sinaliza outro ataque.
Amazônia legal
De acordo com o relatório, quase metade dos envolvimentos (47%) em violência foram registrados na área da Amazônia Legal, mesma região onde os ativistas Dom Phillips e Bruno Pereira foram brutalmente assassinados. Crimes em um cenário de armamento e de incentivo ao garimpo e hostil aos direitos humanos e ao meio ambiente. Quadro construído por Bolsonaro.
Os ambientalistas foram mortos em 5 de junho de 2022, no Dia Mundial do Meio Ambiente, em uma Terra Indígena no Vale do Javari, no Amazonas.
“Foram quatro anos de ataques e hostilidades contra defensores de direitos humanos. E nós defendemos a importância de retomar essa linha histórica. De 2012 para cá, existem dados levantados por organizações internacionais, que historicamente têm feito esse tipo de mapeamento. Mas entendemos que é muito importante que haja uma análise feita a partir do Brasil”, explica Alane Silva, assessora jurídica da Terra de Direitos e uma das coordenadoras da pesquisa. Ela destaca ainda que, levando em conta a subnotificação, o número de ocorrências no período é provavelmente maior.
Vítimas são ativistas
As vítimas que sofreram violências são ativistas que atuam na defesa da população em situação de rua, de ribeirinhos, dos indígenas, quilombolas, crianças, mulheres em situação de violência doméstica, imigrantes em situação vulnerável, alvos de preconceito de raça e de gênero, trabalhadores em situação degradante e vítima de violência armada ou de violação praticada pelas forças de segurança do Estado. São pessoas que defendem o direito à terra, à moradia, ao trabalho, à saúde, à educação e ao tratamento digno, conforme o levantamento.
A assessora jurídica da Terra de Direitos ressalta que os ataques foram fomentados no governo de Bolsonaro com diversos retrocessos como o sucateamento dos órgãos de defesa do meio ambiente e direitos humanos, que promoviam as garantias de direitos em estruturas governadas.
“Houve uma intensificação dos ataques, inclusive pelas falas do governo e pelas falas de diversas figuras públicas escondidas ao governo. E esse ataque verbal legitima o ataque nos territórios. Porque se o próprio governo quilombolas e indígenas como impasse para o desenvolvimento, ele coloca os responsáveis para que os insetos causem”.
Ameaças e assassinatos
O relatório aponta também que muitas pessoas são ameaçadas antes de serem assassinadas. Foram mapeados 169 assassinatos no período, com média de três defensoras ou defensores de direitos humanos mortos a cada mês. Em pelo menos 63,3% dos casos, houve emprego de arma de fogo.
“O crime de ameaça, previsto no Artigo 147 do Código Penal brasileiro, é considerado de menor potencial ofensivo e não chama a atenção das autoridades policiais. Ocorre que, com grande frequência, as ameaças são recorrentes e, em muitos casos, após anos sem sendo investigadas, resultam em homicídios”, constatação do levantamento.
Conflitos no campo
Dos 1.171 casos de violência, pelo menos 919 (78,5%) tiveram como alvo pessoas que defendem o meio ambiente, a terra, que lutam contra o garimpo ilegal e a devastação ambiental.
Do total de violação, 4,8%, foram praticadas contra ativistas dos direitos LGBTQIAP+, 3,7%, contra defensores da moradia e do direito à cidade.
Outro levantamento recente da organização internacional Global Witness afirma que de 227 assassinatos de defensores de terras e do meio ambiente em todo o mundo, no ano de 2020, 20 foram no Brasil. Os números do país só são superados pela Colômbia, pelo México e pelas Filipinas.
Agentes violadores
O estudo também identificou características dos agentes violadores de direitos com pelo menos 32,7% das ocorrências envolvendo empresas, madeireiros, fazendeiros e milícias. Outros 22,9% tiveram participação de agentes públicos como advogados, políticos, representantes de órgãos e administração pública e atores do sistema de Justiça. Em 44,4%, não há informação.
Da Redação do PT, com informações da EBC