Projeto do senador Fabiano Contarato (PT-ES) que proíbe a adoção de técnicas de construção hostis a pessoas em situação de rua havia sido barrado por Bolsonaro, mas Congresso rejeitou veto por ampla maioria
Em votação nesta sexta-feira (16), o Plenário do Congresso Nacional derrubou o veto presidencial à Lei Padre Júlio Lancellotti, que seguiu para a promulgação. Com isso, fica proibida a adoção da chamada arquitetura hostil a pessoas em situação de rua em equipamentos públicos. O projeto (PL 488/2021), do senador Fabiano Contarato (PT-ES), leva o nome do religioso por sua luta em defesa de cidadãos mais vulneráveis e contra construções destinadas a afastar essa população de locais utilizados para pernoite.
O senador destacou a importância humanitária da iniciativa, inspirada no trabalho incansável do padre Júlio, que coordena a Pastoral do Povo da Rua de São Paulo e sempre atuou no acolhimento e alimentação de pessoas em situação de rua. Há cerca de dois anos, o religioso gerou comoção ao empunhar uma marreta para destruir pinos de concreto que haviam sido instalados sob um viaduto de São Paulo para impedir que 32 famílias permanecessem ali. “É um grande humanista. Quando a gente tem um olhar humanizador para os marginalizados, para aqueles que mais precisam, é esse o papel do parlamentar ou de um líder religioso”, afirmou Contarato.
Para ele, o Estatuto das Cidades tem que ser inclusivo, e não exclusivo. “Essas técnicas de arquitetura hostil, com pinos, vergalhões, cercas eletrificadas, instrumentos pontiagudos, bancos sem encosto, entre outras, têm o único objetivo de valorizar um patrimônio em detrimento daquilo que é o mais importante, que é o acolhimento das pessoas em situação de rua”, advertiu.
“O IBGE divulgou os dados: são 68 milhões de pessoas em situação de pobreza, 22 milhões em extrema pobreza. A Constituição estabelece como um de seus fundamentos erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir a desigualdade social e regional. Se me perguntarem qual meu objetivo como parlamentar, vou dizer que é reduzir o abismo existente entre milhões de pobres e a concentração de riqueza na mão de tão poucos, é dar dignidade à população naquilo que é direito humano essencial: moradia digna, oportunidade de trabalho, redução da carga tributária, educação e saúde de qualidade”, concluiu.
A derrubada do veto foi defendida com ênfase também nesta sexta-feira pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), que foi relator na Câmara, e pela deputada Érika Kokay (PT-DF). O relator do texto no Senado foi Paulo Paim (PT-RS), que, ao lado de toda a bancada do partido, se indignou com o anúncio do veto ao projeto na última terça (13), num dos atos mais cruéis de Bolsonaro.
Nesta quinta (15), o padre Júlio Lancellotti participou do encontro de Natal dos Catadores, que todos os anos reúne o presidente Lula com os catadores de papel de São Paulo e desabafou, indignado. “Estamos cansados de sermos tratados como lixo, apanhando da Guarda Civil Metropolitana, da limpeza urbana. São poucos os moradores de rua aqui dentro, muitos estão nas calçadas, nos viadutos. Ninguém quer saber dos mais pobres”, lamentou.
Pouco depois, o presidente Lula destacou este como um dos maiores problemas do país, mencionou o absurdo da arquitetura hostil e se comprometeu a encontrar soluções para as pessoas em situação de rua. “Agora estão fazendo obra, colocando paralelepípedo para não ter espaço. Ou seja, não é que eles não cuidam, é que não querem que nem tenha o direito de deitar debaixo da ponte. Não tem nenhum sentido humanista, de compaixão, de amor”, reagiu.
Do PT no Senado